sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

799. SURREALISMO A SÉRIO

Em Tomar vai haver conversa surrealista a sério na próxima segunda-feira. Não sobre o surrealismo do dia-a-dia, sobre o surrealismo que é por vezes viver em Tomar, mas sobre arte e cultura. Um dos elementos do Grupo Surrealista de Lisboa, o historiador e crítico de arte José-Augusto França, é um dos participantes na mesa-redonda que, segunda-feira, assinala, em Tomar, os 60 anos da primeira, e única, exposição do Grupo.

Inês Santos, do Serviço de Museus da Câmara Municipal de Tomar, justifica a iniciativa da autarquia tomarense, de assinalar, "exactamente 60 anos depois", a exposição do Grupo Surrealista de Lisboa, por ter, no seu Núcleo de Arte Contemporânea, representados muitos dos elementos que integraram essa corrente artística.
O Núcleo de Arte Contemporânea de Tomar foi constituído a partir da doação da colecção de José-Augusto França, tomarense de nascimento, à cidade, contendo no seu acervo "um significativo número de obras" produzidas por artistas do Grupo Surrealista de Lisboa. Este reuniu nomes como Alexandre O'Neill (poeta), António Dacosta (pintor), António Pedro (pintor, ceramista, poeta, dramaturgo, teatrólogo), Fernando de Azevedo (pintor, artista gráfico, crítico de arte), João Moniz Pereira (pintor), José-Augusto França, Marcelino Vespeira (pintor, artista gráfico), Mário Cesariny (poeta e pintor) e António Domingues (pintor).
Além de José-Augusto França, a mesa-redonda conta com a presença dos elementos da Comissão Orientadora do Museu, os críticos e historiadores de arte Rui Mário Gonçalves e Raquel Henriques da Silva, e ainda de Cristina de Azevedo Tavares, filha de Fernando de Azevedo, que não era viva à época "mas viveu sempre de perto com este universo, o que pode igualmente trazer uma perspectiva interessante ao debate", afirmou Inês Santos.
Na sessão, que vai decorrer no Club Thomarense, na Corredoura, junto ao Café Paraíso, será ainda lido o testemunho de Fernando Lemos (pintura, desenho, fotografia, gravura), a residir no Brasil (em S. Paulo) desde 1953, artista que aderiu ao surrealismo a partir da exposição de 19 de Janeiro de 1949, disse.
Para Março estão previstas iniciativas alusivas ao Surrealismo para os dias da Poesia e do Teatro, este associando-se ao centenário do nascimento de António Pedro, sendo provável a exibição de uma das suas peças de teatro, acrescentou.
O Grupo Surrealista de Lisboa nasceu de um encontro na pastelaria Mexicana, em Outubro de 1947, seguindo-se numerosas actividades e reuniões, em casa de António Pedro ou no atelier de que o Grupo dispunha na Avenida da Liberdade. Às posições anti-neo-realistas provocatórias, juntaram-se atitudes contra o regime do Estado Novo, tendo os elementos do Grupo retirado a sua colaboração da III Exposição Geral de Artes Plásticas, por recusar submeter as suas obras a censura prévia. Quando, a 19 de Janeiro de 1949, se realizou a Exposição do Grupo Surrealista de Lisboa, este já não contava com os nomes de Mário Cesariny e António Domingues, que se afastaram em Agosto de 1948 para formarem o Grupo Surreealista Dissidente, que integrou ainda António Maria Lisboa e Pedro Oom.
1949 foi o ano das principais manifestações do movimento surrealista em Portugal, tendo Alexandre O'Neill publicado na altura da exposição "A Ampola Miraculosa" (15 imagens sem qualquer ligação), considerada obra paradigmática do surrealismo português, seguindo-se o lançamento dos primeiros números dos Cadernos Surrealistas. Em Maio desse ano, o Grupo Surrealista Dissidente organizou uma série de conferências, "O Surrealismo e o seu Público", em que António Maria Lisboa leu o que foi considerado o primeiro manifesto surrealista português, e organizou ainda duas exposições (Junho de 1949 e Junho de 1950).
A uma fase de ataques pessoais entre os dois grupos (1950/52), seguiu-se, após a morte de António Maria Lisboa, a extinção dos grupos surrealistas. O surrealismo português foi influenciado pelo francês, sobretudo pela escola de André Breton, que escreveu o seu "manifesto do surrealismo" em 1924. Esta corrente artística favorece as associações vocabulares livres e estabelece o primado da imaginação, tendo introduzido na poesia a "escrita automática". Tardio em Portugal, o movimento aliou poetas, críticos, pintores e desenhistas, tendo-se dedicado a edições colectivas e antologias.
Fonte: Lusa

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